No Brasil uma empresa pode ser processada e até condenada criminalmente por crimes ambientais. E mais: isso pode acontecer mesmo sem que nenhum gestor, sócio ou funcionário específico seja responsabilizado junto com ela.
Esse é um dos temas mais polêmicos do Direito Penal ambiental e tem consequências diretas para empresas de todos os setores. Multas milionárias, paralisação de atividades e danos irreparáveis à reputação são apenas alguns dos riscos que um processo criminal pode trazer. Mas como chegamos até aqui?
A Lei de Crimes Ambientais e os problemas da sua criação.
A Lei nº 9.605/1998, conhecida como Lei de Crimes Ambientais, foi criada em um contexto de forte pressão internacional para que o Brasil endurecesse suas normas de proteção ambiental. A Constituição Federal de 1988 já havia previsto, no artigo 225, a necessidade de tutela penal do meio ambiente, e a nova legislação veio para dar concretude a esse mandamento.
No entanto, desde sua origem, a lei foi alvo de críticas severas. Penalistas renomados apontaram problemas como:
- Sobreposição entre infrações administrativas e crimes, criminalizando condutas que poderiam ser resolvidas apenas na esfera administrativa;
- Técnica legislativa deficiente, com artigos confusos e abertos a interpretações subjetivas, comprometendo a segurança jurídica;
- Previsão de responsabilidade penal da pessoa jurídica sem que o processo penal brasileiro estivesse estruturado para isso.
Essas falhas iniciais não ficaram no passado: até hoje elas repercutem na forma como empresas e gestores são responsabilizados. Um exemplo clássico dessa sobreposição é o crime de operar atividade com licença ambiental vencida, tema que já abordamos em detalhe em artigo deste blog. Nesses casos, condutas que poderiam ser resolvidas na esfera administrativa acabam levando empresas e gestores ao banco dos réus.
A Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica.
Um dos pontos mais inovadores — e polêmicos — da Lei de Crimes Ambientais foi a introdução da responsabilidade penal da pessoa jurídica. O artigo 225, §3º, da Constituição Federal, já autorizava essa possibilidade, e a lei a regulamentou.
No entanto, o Direito Penal tradicional sempre foi construído sobre a ideia de dolo (intenção) ou culpa (negligência, imprudência ou imperícia). Como aplicar esses conceitos a uma empresa, que não tem vontade própria?
A doutrina se dividiu entre os defensores dessa responsabilização — que afirmam que responsabilizar empresas é essencial para uma tutela efetiva do meio ambiente — e os críticos — que alertam para o risco de responsabilização objetiva, sem comprovação de culpa ou dolo, o que viola princípios fundamentais do Direito Penal. De qualquer forma, a responsabilização penal das empresas está consolidada e já é aplicada pelos tribunais. E nem mesmo entidades associativas estão livres desses riscos: recentemente, uma cooperativa agroindustrial foi condenada criminalmente por crime ambiental relacionado à emissão de poluição atmosférica no Paraná, com multa e obrigação de custear projetos ambientais. Esse caso real, noticiado pelo Ministério Público do Paraná, mostra que a responsabilização penal não se restringe a empresas privadas tradicionais — leia aqui a íntegra da notícia.
A Empresa pode ser condenada isoladamente?
Por muitos anos, prevaleceu a chamada teoria da dupla imputação, segundo a qual a empresa só poderia ser denunciada se houvesse, ao mesmo tempo, imputação a uma pessoa física. A lógica era simples: empresas não agem sozinhas.
Esse cenário mudou em 2013, com o julgamento do Recurso Extraordinário nº 548.181, pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Na ocasião, o Tribunal decidiu que a empresa pode ser processada e condenada criminalmente mesmo sem a responsabilização de um gestor ou dirigente.
O fundamento foi de que a Constituição não exige essa vinculação, e que a dupla imputação dificultava a punição de pessoas jurídicas que causavam danos ambientais. A partir daí, o entendimento foi consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e por outros tribunais.
O problema é que essa interpretação ampliou o risco de responsabilização sem comprovação de dolo ou culpa claros, o que pode levar a condenações sem um nexo definido entre a conduta da empresa e o crime ambiental.
O que isso significa para sua Empresa?
Na prática, a possibilidade de responsabilização penal da pessoa jurídica é uma realidade. Isso significa que qualquer empresa pode ser alvo de processo criminal por infrações ambientais, com consequências como:
- Multas de alto valor;
- Suspensão ou interdição de atividades;
- Perda de credibilidade e impacto reputacional.
Mesmo com uma atuação preventiva, empresas podem acabar sendo investigadas criminalmente. Nesses casos, é essencial avaliar a possibilidade de soluções estratégicas, como acordos penais, que podem encerrar o processo antes da condenação. Explicamos detalhadamente essas alternativas neste artigo do blog.
Diante desse cenário, torna-se indispensável que as empresas adotem medidas preventivas, como:
- Implantação de programas de compliance ambiental;
- Criação de mecanismos internos de monitoramento e controle;
- Assessoria jurídica especializada para prevenção e defesa em casos concretos.
Conclusão
A responsabilização penal da pessoa jurídica é um dos maiores desafios do Direito Penal ambiental no Brasil. Embora tenha sido consolidada pelos tribunais, ainda levanta debates relevantes sobre seus limites e impactos para a segurança jurídica.
O fato é que sua empresa pode, sim, ser condenada criminalmente por crimes ambientais — inclusive de forma isolada, sem que gestores sejam processados junto. E, como vimos, nem mesmo cooperativas escapam desse risco.
Nesse cenário, a melhor estratégia é atuar preventivamente, com políticas de compliance e gestão ambiental eficazes. E, claro, contar com uma defesa técnica especializada sempre que houver risco de responsabilização. Já mostramos em outro artigo que até situações aparentemente formais, como uma licença ambiental vencida,




